Dafne Editora

Livros de Arquitectura

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Livros de Arquitectura

Longe da Vista
João Mário Grilo e Nuno Portas

Nuno Portas (…) Lembro-me de que, quando fazíamos «política de autores» do cinema, a maior parte dos autores de que gostávamos – não todos – era do cinema mais duro, retratos de tranches de vie, fosse do cinema negro americano, fosse do primeiro neo-realismo italiano, fosse de uma parte do cinema negro francês. Depois, não sei se por compensação ou para irritar os críticos mais engagés, também defendíamos o cinema dos telefones brancos e o musical americano. Mas andávamos numa espécie de dualismo… O que têm em comum estas várias escolas ou tendências do cinema é o «álibi da realidade», que permite reconhecermos o espaço, a distância, através de uma coisa que, não por acaso, é a fotografia. Isto é diferente do teatro. O teatro não pretende convencer-nos de que aquela casa é real; as casas são artifícios. O cenário do teatro, na maioria dos casos, é um cenário simbólico. O cenário, a mise-en-scène no cinema, no meu modo de ver, é diferente, joga com o verismo, que vem do Dziga Vertov e de outros, até hoje: o «com a verdade me enganas».

Não sei se isto é muito ortodoxo ou se não é, só queria dizer que o filme do João Mário Grilo me convenceu, em grande parte, porque reconheci as distâncias, o grão da fotografia, o perceber a humidade que devia haver naquelas paredes. Ou outros factores: perceber, sem fazer grandes travellings a alta velocidade, o que eram aqueles corredores de Monsanto, em que as pessoas se deslocavam de um lado para outro, entre a cela e outros espaços de estar, como o refeitório ou o locutório. Ele não usa tanto o panóptico mas quase o contrário – são os corredores em que eles se deslocam.

(…)

João Mário Grilo Para mim, o mais importante comentário do cinema sobre a arquitectura é o princípio do The Searchers, a porta que se abre. É preciso dizer que o Ford reconstruiu num outro lugar a fachada da casa de Monument Valley, justamente para marcar o facto de no cinema e na arquitectura se fazerem coisas diferentes. The Searchers é um filme sobre isso, sobre o modo como a arquitectura gera coisas e sobre o modo como o cinema pode pensar a forma como a arquitectura as gera. Isto porquê? Porque está ligado, verdadeiramente, à noção de experiência. Há, seguramente, coisas interessantes sobre as quais a arquitectura deve reflectir a partir da noção de experiência que o cinema trabalha incessantemente, que é uma noção muito extensa da experiência. Tem a ver com o tempo, com o uso, com o trajecto, tem a ver com todos esses valores. Para um arquitecto é difícil. Não sei se a arquitectura tem modelos para pensar isto.

Veja aqui mais informações sobre o livro que reúne todos os fascículos desta colecção

Gratuito

O Lugar dos Ricos e dos Pobres: n.º 8
Dimensões: 40 p., 15,0×22,5 cm
Edição: Dafne Editora
Data: Outubro de 2014
Design: João Guedes/Dobra